Emanuel Rego, campeão olímpico do Vôlei de Praia e membro do Colegiado de Direção do CBC comenta experiências olímpicas e o balanço geral olímpico do CBC em entrevista exclusiva

19, Agosto 2021
Emanuel Rego, campeão olímpico do Vôlei de Praia e membro do Colegiado de Direção do CBC comenta experiências olímpicas e o balanço geral olímpico do CBC em entrevista exclusiva

Emanuel Rego, atleta campeão olímpico do Vôlei de Praia e membro do Colegiado de Direção do CBC, concedeu uma entrevista exclusiva ao CBC para comentar suas experiências olímpicas e o balanço geral dos Jogos Olímpicos de Tóquio produzido pelo CBC, que destaca o desempenho dos atletas de Clubes formadores nos Jogos.

Como já apresentado pelo CBC no balanço, os Clubes formadores desempenharam um papel de extrema relevância para as conquistas dos atletas nos Jogos. O País teve o melhor desempenho de todos os tempos em Tóquio, com a conquista de 21 medalhas, e 6 das 7 medalhas de ouro conquistadas são de atletas de Clubes.

Emanuel Rego é uma das maiores personalidades do Vôlei de Praia brasileiro e tem larga experiência na gestão esportiva. Já foi Secretário Nacional de Esporte de Alto Rendimento (2019 - 2020), Secretário Nacional da Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem (2019), Diretor Executivo de Esportes Olímpicos no Fluminense Football Club-RJ e Embaixador do Esporte pelo Banco do Brasil. Também já foi Presidente da Comissão de Atletas no Comitê Olímpico do Brasil (COB) e na Confederação Brasileira de Voleibol (CBV). No esporte, suas principais conquistas foram a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Atenas 2004, de prata nos Jogos Olímpicos de Londres 2012 e o bronze nos Jogos Olímpicos de Pequim 2008.

Confira a entrevista exclusiva

 

Comitê Brasileiro de Clubes – Qual foi a sua experiência mais inesquecível enquanto atleta nas edições dos Jogos Olímpicos em que participou?

Emanuel Rego – Queria relembrar de dois fatos muito interessantes na minha carreira que envolveram Olimpíadas. O primeiro foi a minha primeira participação em Jogos, que foi em Atlanta 1996. Essa foi a primeira edição com o Vôlei de Praia, e minha estreia com 23 anos. Quando você tem essa idade, acredita que sempre vai ganhar, que você está acima da auto confiança. Na época, enquanto fazia a preparação para as Olimpíadas, não existia nada no Brasil que nos preparasse para isso, textos ou artigos científicos sobre o Vôlei de Praia em grandes eventos. Então fomos muito empíricos, inventamos muito, com treinamentos que eram fora da curva, a exemplo do spinning para velocidade, equilíbrio em cima de muro, corridas longas com mais de uma hora e meia. Testamos muitas coisas e quando você testa tem grandes chances de dar errado, e acho que foi isso que aconteceu. Foi uma grande frustração, mas ali também foi o princípio da mudança, do conhecimento e do crescimento.

Em 2000, eu já fui para os Jogos mais preparado, como favorito, e ficamos em nono lugar pelo campeonato em si, mas usando essas duas experiências negativas, eu consegui transformar minha equipe com Ricardo para Atenas 2004 em uma equipe totalmente preparada para buscar o melhor resultado. Usei as experiências de 1996 e 2000 somente para agregar. Nós tínhamos profissionais de fisioterapia, de estatística, inclusive nós que inserimos a estatística no Vôlei de Praia, fomos os precursores em estudar os adversários. Criamos várias inovações para sermos bem sucedidos em Olimpíadas. Ficou o contraponto, em 1996 estava cru, sem base e sem experiência, para depois em 2004 transformar o time em ciência, aproveitar todo esse conhecimento para ser melhor. Essa evolução para mim foi o fundamental, porque quando participamos de uma Olimpíada, sempre achamos que vamos vencer, ganhar a medalha, e não, temos que construir a medalha.

 

Comitê Brasileiro de Clubes – E qual é a sua experiência mais importante agora enquanto analista dos Jogos atuais, como comentarista de grandes emissoras de TV, e o que mais marcou nessa edição dos Jogos?

Emanuel Rego – Essa foi a segunda oportunidade de ser comentarista, eu já tinha participado em 2016 e foi uma experiência muito boa de poder acompanhar os jogos em casa, presencialmente. Dessa vez, de forma virtual, foi diferente para mim e acho que foi diferente para todas as pessoas que acompanharam. O que eu achei mais inusitado foi que os atletas talvez não estivessem com a preparação em 100%, não chegaram com as melhores atuações pelo momento que vivemos. Mas senti a superação dos brasileiros, que eles lutaram para jogar num local diferente do que eles estavam habituados, e sem público, sem a energia das Olimpíadas. Por exemplo, no Vôlei de Praia masculino, o campeão foi um time da Noruega, o segundo foi da Rússia e o terceiro foi um time do Catar, que são times que têm perfis emocionais mais gelados, que não se envolvem com torcida, então para mim essa foi a diferença. Mas eu gostei de ver a raça dos brasileiros, mesmo jogando num lugar diferente eles conseguiram até se superar em alguns momentos.

 

Comitê Brasileiro de Clubes – Teve algum momento ou fato de algum atleta que você se emocionou mais, que você vai se lembrar dessas Olimpíadas?

Emanuel Rego – Sim. Eu estava esperando na Globo para a transmissão de um jogo do Vôlei de Praia masculino, e foi bem no dia da medalha de ouro da Ana Marcela, da Maratona Aquática. Como chegamos mais cedo para fazer a transmissão, eu estava na área de espera assistindo e acompanhei desde o início da prova dela. Mas nos últimos 20 minutos, estava eu, Bernardinho e Everaldo assistindo juntos e torcendo a cada braçada. Mesmo longe do espirito olímpico, praticamente do outro lado do mundo, conseguimos nos conectar para ver aquela medalha. E foi brilhante, quando ela tocou na frente das outras atletas, eu e o Everaldo comemoramos muito, foi um momento marcante ver a medalha de ouro da Ana Marcela. Foi muita emoção a que trocamos nos bastidores e isso vai ficar gravado na minha memória olímpica.

 

Comitê Brasileiro de Clubes – Esses Jogos Olímpicos foram totalmente diferentes inclusive para os comentaristas. Percebemos muita emoção e união de fato, conte mais para nós sobre estes bastidores

Emanuel Rego – Nós estávamos muito unidos. Praticamente era uma composição de quase 100 atletas, 100 pessoas do esporte, falando sobre sua modalidade e acho que isso foi uma interação muito boa. Outro quesito que eu posso comentar para vocês que foi único é que normalmente quando se vai para uma Olimpíada, quando acaba qualquer jogo, o atleta vai para a zona mista e há o contato direto com a imprensa, e geralmente são 100 veículos, entre jornais e televisões do mundo todo, então são muitas pessoas. Mas dessa vez eu senti que eram poucos repórteres que estavam ali, geralmente só os do país de origem, então modificou até as entrevistas dos atletas brasileiros. Quando eles ganhavam, os espectadores brasileiros podiam vê-los falando de forma muito pessoal, direto para eles. Então a transmissão conseguiu tirar as emoções do atleta de forma que eu nunca tinha visto em outras Olimpíadas, que era uma emoção pura. Todos os atletas mostraram o coração.

 

Comitê Brasileiro de Clubes – Dos índices apresentados pelo CBC referente ao Programa Rumo a Tóquio sobre a atuação dos clubes na formação dos atletas, para você, qual foi o que mais chamou a atenção, já que é membro do Colegiado de Direção do CBC?

Emanuel Rego – Acredito que os números de conquistas do Brasil foram muito impressionantes, a sequência de resultados de 2016 para 2020, de resultados positivos. Mas o que mais me surpreendeu foi o número de atletas que são da delegação e que fazem parte da família CBC, que são os Clubes. Me surpreendeu, são 268 atletas, de uma gama de 303 atletas, é um número muito impressionante, e a tendência, na minha visão, é aumentar.

Os Clubes formadores estão trabalhando hoje com novos atletas, e estamos falando de atletas muito mais jovens, de 14 a 19 anos que ainda estão em formação. E eu tenho certeza que se de 2017 para cá tivemos esse crescimento de atletas participando do alto rendimento, acredito que a cada Ciclo Olímpico vamos ver esse número aumentar. Hoje são 268, mas para os próximos, será ampliado. Para mim, o melhor dado dessas Olimpíadas é a amplitude do trabalho dos Clubes e do CBC perante o volume de atletas que foram convocados.

 

Comitê Brasileiro de Clubes – É possível traçar também um paralelo entre o fortalecimento do Programa de Formação de Atletas do CBC, que atuando diretamente com os Clubes, gerou esses resultados?

Emanuel Rego – Sim, e eu acredito que não apenas na atuação direta com os Clubes, mas enxergo também um fortalecimento perante às Confederações. Com o trabalho do CBC, as Confederações começam a acreditar nesse processo, no Programa dentro dos Clubes e isso fomenta a cadeia inversa também. Antigamente no Brasil, víamos que a Confederação estimulava os Clubes para que o esporte fosse desenvolvido e tudo isso acontecesse. Agora, com o CBC, o movimento é inverso. O CBC cria o fomento no Clube, que chama a atenção da Confederação, gerando um benefício para todos. O benefício para o Clube faz com que a Confederação também seja privilegiada e faça um trabalho ainda melhor para os próximos anos.

 

Comitê Brasileiro de Clubes – Qual recado você passaria aos Clubes Formadores para este Ciclo Olímpico, visando Paris 2024, já que ele será mais curto e necessitará de grande adaptação de todos?

Emanuel Rego – Eu sou apaixonado pelos Clubes. Lembro que comecei a jogar Vôlei muito jovem, com 10 anos, no Círculo Militar do Paraná-PR, e essas memórias são muito fortes. Nós passamos por muitos momentos incríveis no esporte, mas aquele início fica na memória. Muitas vezes vamos jogar no Clube pelas amizades e pelo ambiente seguro que ele proporciona, e essa é uma coisa muito legal do Clube, é um ambiente que os pais confiam em deixar seus filhos para que haja o desenvolvimento motor, intelectual e também a construção das amizades. Tanto o Círculo quanto o Clube Curitibano-PR por onde passei como atleta foram fundamentais para a minha formação.

Há também uma segunda parte da minha história, em que passei como gestor pelo Fluminense Football Club-RJ, que para mim foi muito importante, porque consegui entender a amplitude do que é formar atletas de várias modalidades, os desafios dessa formação. Meu recado é o reconhecimento de que os Clubes contribuem de forma grandiosa para o esporte nacional, eles são a base, o início não só dos atletas de alto rendimento, mas também da paixão pelo esporte.

 

Comitê Brasileiro de Clubes – E qual recado você deixa para os atletas?

Emanuel Rego – Meu recado é que os atletas observem que tem muitas pessoas, muitas entidades trabalhando fortemente para que venham os bons resultados. Muitas vezes como atleta nós só enxergamos o nosso treino, nosso trabalho. Mas nos bastidores, nos Clubes, nas Confederações, Federações e entidades com o CBC, tem muitas pessoas engajadas e investindo nos resultados. Meu recado é que eles tenham uma visão ampla para que todos possam ser beneficiados, que enxerguem o papel deles no esporte. Quando o atleta veste a camisa de um Clube, ele está vestindo a camisa de uma instituição que investe e que acredita que o esporte pode mudar a vida das pessoas, essa é a grande mensagem, o esporte muda vidas.